Open Health — Dúvidas e riscos com o modelo


Sistema proposto pelo ministro da Saúde provoca polêmica por compartilhar informações e dados e por elevar o risco de uma área vulnerável


Valor Econômico Setorial
Saúde

Junho 2022
Por Genilson Cezar


A possibilidade de mau uso dos dados pessoais de beneficiários dos planos privados de saúde e dos usuários dos sistemas públicos de assistência médica é apontada por associações médicas, especialistas do setor de saúde e entidades de defesa dos consumidores como o maior risco da implementação no país de um sistema open health, proposto pelo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga.


“Apesar de sua roupagem moderna, não me parece promissora a adoção do open health no Brasil, porque vai permitir às operadoras utilizar as informações de saúde e condições físicas dos beneficiários sob a ótica do risco antes de aceitar um novo consumidor”, diz Cesar Eduardo Fernandes, presidente da Associação Médica Brasileira (AMB). 

“A AMB não vê com bons olhos adotar uma solução inspirada no open banking em uma área tão vulnerável como a saúde.”


“A AMB não vê com bons olhos adotar uma solução inspirada no open banking em uma área tão vulnerável como a saúde.”


Para o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), existem riscos de uso de dados pessoais de saúde contra os usuários. 

“Por exemplo, quando seguradoras de saúde definem perfis de saúde de cada usuário e excluem pessoas com questões específicas de saúde da cobertura de planos”, diz Matheus Falcão, advogado do programa da saúde do Idec. 


Para o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), existem riscos de uso de dados pessoais de saúde contra os usuários.

“Essa prática é vedada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). 

No entanto, há a preocupação de que as operadoras façam perfis dos usuários e utilizem esses recursos para não cobrir os usuários no período de cobertura parcial temporária, indicando que a pessoa tem uma lesão preexistente.”


“Essa prática é vedada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).

No entanto, há a preocupação de que as operadoras façam perfis dos usuários e utilizem esses recursos para não cobrir os usuários no período de cobertura parcial temporária, indicando que a pessoa tem uma lesão preexistente.”



Segundo Falcão, o Idec se preocupa com a segurança dos dados, em especial considerando graves incidentes de vulnerabilidade ocorridos no setor de saúde durante a pandemia do coronavírus. 

“Os esforços do Ministério da Saúde deveriam se concentrar em resolver essas falhas e implementar a Rede Nacional de Dados em Saúde, com enfoque em fortalecer o Sistema Único de Saúde (SUS) e tornar o serviço público mais eficiente.


Baseada na plataforma open banking, que padronizou o compartilhamento de dados entre instituições do mercado financeiro, o sistema idealizado por Queiroga prevê a abertura dos dados dos usuários com as empresas de planos de saúde para que ofereçam serviços mais vantajosos, de acordo com o perfil do cliente. 

Segundo o ministro, o objetivo seria ampliar a concorrência no mercado de planos de saúde. 

A proposta está sendo analisada pelos ministérios da Saúde, da Casa Civil, da Economia e da Justiça, e espera-se que um primeiro teste-piloto seja realizado, em agosto, na Rede Nacional de Dados em Saúde.


A proposta está sendo analisada pelos ministérios da Saúde, da Casa Civil, da Economia e da Justiça, e espera-se que um primeiro teste-piloto seja realizado, em agosto, na Rede Nacional de Dados em Saúde.


Segundo José Cechin, superintendente-executivo do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), ainda não é possível uma avaliação taxativa, porque não há uma definição do que o Ministério da Saúde realmente entende por open health. 

“Por vezes, parece um projeto superambicioso, que facilitaria a competição, a troca de planos de saúde, a transparência de informações. Tenho dúvidas sobre sua factibilidade, se a proposta for nessa direção. Porque aí, sim, enfrentaria um obstáculo severo que é a privacidade das informações sobre a saúde das pessoas.”


Segundo José Cechin, superintendente-executivo do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), ainda não é possível uma avaliação taxativa, porque não há uma definição do que o Ministério da Saúde realmente entende por open health.


Para ele, o projeto poderia se ater a construir um registro ou prontuário eletrônico centralizado — que não precisa estar nas mãos do governo — dos acontecimentos de saúde de cada pessoa. 

“Isso tem um extraordinário valor.” Na verdade, esboços desse prontuário até existem, espalhados em diversas áreas, quase sempre na forma eletrônica.

“O problema está em que essa multiplicidade de prontuários está dispersa e, presumo, cada dono preza o seu. 

O trabalho aqui é o de agrupar todas as informações de cada pessoa, não importa em que prestador estejam, em um único centro, para acesso mediante senha portada pelo titular das informações. 

A essa pessoa cabe autorizar o acesso, para leitura e escrita.”


Para ele, o projeto poderia se ater a construir um registro ou prontuário eletrônico centralizado — que não precisa estar nas mãos do governo — dos acontecimentos de saúde de cada pessoa.


O trabalho aqui é o de agrupar todas as informações de cada pessoa, não importa em que prestador estejam, em um único centro, para acesso mediante senha portada pelo titular das informações.

A essa pessoa cabe autorizar o acesso, para leitura e escrita.”


Presidente dos conselhos do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (Ieps) e do Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social (IMDS) e ex-presidente do Banco Central, o economista Armínio Fraga acredita que a criação de um prontuário eletrônico único, centralizando todas as informações de saúde de todos os brasileiros, poderia revolucionar esse setor no país. 

“Sem dúvida, haveria ganhos de eficiência para o sistema de saúde e bem-estar social.”


Mas permanece a preocupação, segundo ele, de que essas informações sensíveis possam cair em mãos não autorizadas — instituições do mercado financeiro e operadoras dos planos de saúde -, como deixa a entender a proposta de Queiroga, que prevê o compartilhamento de acesso aos dados com as empresas privadas do setor de saúde. 


“Esse é o meu maior receio, esse acesso liberado, o que na literatura se traduziria por deixar com os planos de saúde privados apenas o filé.”


Armínio Fraga acredita que a criação de um prontuário eletrônico único, centralizando todas as informações de saúde de todos os brasileiros, poderia revolucionar esse setor no país …

Mas permanece a preocupação, segundo ele, de que essas informações sensíveis possam cair em mãos não autorizadas …

“Esse é o meu maior receio, esse acesso liberado, o que na literatura se traduziria por deixar com os planos de saúde privados apenas o filé.”


Em relação à enorme quantidade dos dados que deverão ser coletados e centralizados numa única base de informações, um dos maiores desafios, segundo André Cripa, chief innovation officer da CTC, empresa de tecnologia com foco em saúde, devem ser a estruturação de redes, a interoperabilidade entre diferentes sistemas e as novas tecnologias que permitam a implementação desse sistema de open health

“Não deve ser uma corrido de curto prazo, mas uma implementação gradual, que envolva as redes públicas e privadas.”


… um dos maiores desafios, … devem ser a estruturação de redes, a interoperabilidade entre diferentes sistemas e as novas tecnologias que permitam a implementação desse sistema de open health. — André Cripa –


Também a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), que reúne as maiores operadoras de planos de saúde, pondera que, diferente do setor bancário, as discussões em torno da implementação do open health na saúde são incipiente, requerendo adequações tecnológicas e tempo para executá-las. 

“Por ser um segmento que presta atendimento essencial a milhões de brasileiros, é preciso que as propostas a respeito do tema considerem as particularidades, desafios tecnológicos e processuais inerentes ao setor de saúde, congregando posições técnicas, participação social, formulação de debates e estudos setoriais”, diz Vera Valente, diretora-executiva da FenaSaúde.


Também na FenaSaúde,…diferente do setor bancário, as discussões em torno da implementação do open health na saúde são incipiente, requerendo adequações tecnológicas e tempo para executá-las (Vera Valent)


Names mentioned


Cesar Eduardo Fernandes,
presidente da Associação Médica Brasileira (AMB)

Matheus Falcão, advogado do programa da saúde do Idec.

José Cechin, superintendente-executivo do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS)

Presidente dos conselhos do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (Ieps) e do Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social (IMDS) e ex-presidente do Banco Central, o economista Armínio Fraga

André Cripa, chief innovation officer da CTC, empresa de tecnologia com foco em saúde

Vera Valente, diretora-executiva da FenaSaúde.

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